ISBN: 978-65-5492-140-4
DOI: 10.5281/zenodo.17086480
Descrição:
"O saber contra a ignorância, a saúde contra a doença, a vida contra a morte, mil reflexos da batalha permanente em que estamos todos envolvidos".
Oswaldo Cruz
“O bom da ciência é que ela nunca está pronta”. Esta também poderia ter sido uma frase dita por Oswaldo Cruz, médico, cientista e visionário que, no início do século XX, ousou imaginar um Brasil onde a saúde pública seria um direito e não um privilégio. Inspirado por essa missão, ele lançou as bases do que viria a ser uma das instituições mais respeitadas da América Latina: a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), nascida da urgência sanitária, mas guiada por um compromisso permanente com a ciência, a educação e a justiça social.
A Fiocruz, ao longo de mais de um século de atuação, é uma referência em pesquisa, ensino e formulação de políticas públicas voltadas à promoção da saúde coletiva no Brasil. Como retratado por Finkelman (2002), a trajetória da instituição se entrelaça com os grandes marcos da saúde pública no país, desde as campanhas sanitárias do início do século XX até sua atuação decisiva na formulação e defesa do Sistema Único de Saúde (SUS). Esse legado institucional se renova constantemente por meio de iniciativas formativas que apostam na ciência como prática social transformadora. Prova disso é que a Fiocruz continua seu pioneirismo ao investigar a seara da Inteligência Artificial (IA) no âmbito do humanismo digital.
A presente coletânea é fruto de um esforço coletivo que articula inovação tecnológica, formação científica e o compromisso histórico da Fiocruz com a saúde pública brasileira. Reunindo artigos produzidos durante os cursos “Escrita Científica com Inteligência Artificial Humanizada” — realizados nas unidades da Fiocruz no Rio de Janeiro e no Instituto Aggeu Magalhães, em Recife, ao longo de 2024 —, esta obra expressa um momento singular de convergência entre ciência aberta, ética, pedagogia crítica e tecnologias emergentes. Mais do que reunir pensamentos e estudos, esta obra abre os horizontes para o desvelamento das aplicações da IA na Saúde Pública brasileira.
Nesse mesmo sentido, Lima, Fonseca e Santos (2006) sublinham que a Fiocruz constitui não apenas um polo de produção de conhecimento, mas uma verdadeira escola para a saúde, comprometida com a construção democrática de saberes e com a valorização da educação como eixo estruturante das políticas públicas. A presente obra, ao promover a articulação entre escrita científica e inteligência artificial humanizada, abre um novo horizonte formativo para pesquisadores, estudantes e profissionais comprometidos com a ética, a autoria crítica e o fortalecimento do SUS. Faz-se necessário isso para que o compromisso da Fiocruz continue atuante no cenário nacional e internacional como polo do saber científico e cuidado sanitário.
Cabe pontuar que a proposta original partiu da professora Izabela Gimenes, colaboradora de longa data do Laboratório de farmacologia do INCQS e atualmente Coordenadora da Célula de Inovação Aberta do Polén da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENASP/Fiocruz), e do pesquisador Marcos Rogério Martins Costa, professor efetivo da Universidade Estadual de Goiás (UEG) e pós-doutorando no Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz), que visualizaram a possibilidade de integrar o pensamento crítico acadêmico com ferramentas de inteligência artificial emergentes, como parte do desenvolvimento do projeto de pós-doutorado de Marcos Costa na Fiocruz, sob supervisão do professor Fausto Ferraris, um grande amigo com o qual pude construir lado a lado o Laboratório de Farmacologia do INCQS. Esse projeto propôs não apenas ensinar, mas desafiar os alunos a produzir ciência com o auxílio da IA.
Destaca-se ainda a atuação de Erika Nazaré Gadelha Meira Cerqueira, sócia- fundadora da iniciativa Escrita com Ciência ao lado de Marcos Rogério Martins Costa. Juntos, eles conceberam e implementaram a metodologia didática que deu origem ao curso, desenhando seu formato inovador e coordenando sua realização nas duas edições. A Escrita com Ciência é uma startup educacional que já acumula mais de doze conquistas nacionais e internacionais, incluindo premiações e seleções em editais de fomento à inovação. Dentre seus destaques, figura a criação de um estúdio de projetos científicos, voltado à democratização e difusão do letramento científico no Brasil, fortalecendo pontes entre tecnologia, educação e saúde pública.
O conceito de inteligência artificial humanizada foi central na concepção e execução dos cursos. Mais do que aplicar algoritmos, os participantes foram estimulados a refletir criticamente sobre ética, autoria e a mediação humana na produção do conhecimento. Essa abordagem resultou em um ambiente fértil para a experimentação metodológica e a inovação didática, culminando na produção de artigos de alta relevância científica (Costa et al., 2024), e cuja proposta central foi repensar o papel da IA não como substituta da cognição humana, mas como ferramenta que amplia capacidades reflexivas, criativas e expressivas dos sujeitos na ciência.
A presença estratégica do professor Marcos Aurélio Ayres da Silva, CEO da startup Escritha foi fundamental para realização do curso e foi com o suporte da plataforma desenvolvida pela sua empresa que a primeira edição do curso, no Rio de Janeiro, pôde ocorrer. A Escritha não apenas viabilizou a estrutura tecnológica, como também contribuiu ativamente para a difusão do conceito de escrita científica com IA integrada ao raciocínio humano.
A proposta inovadora não se restringiu a transmitir conteúdos os cursos desafiaram os participantes a redigir, em uma semana, artigos científicos com o apoio da IA e mediação metodológica docente. Os alunos, majoritariamente vinculados à área da saúde pública, foram provocados a pensar criticamente sobre autoria, uso ético da tecnologia, e os novos paradigmas de produção do saber.
A experiência vivida nos cursos “Escrita Científica com Inteligência Artificial Humanizada” mostrou que o uso da IA na produção de artigos científicos vai muito além de uma inovação pontual: trata-se de uma proposta metodológica comprometida com ética, qualidade e sentido formativo. Dos dezenove artigos desenvolvidos ao longo das atividades, cinco foram escolhidos para integrar esta coletânea. A seleção considerou a consistência argumentativa, a profundidade dos temas abordados e a originalidade metodológica dos trabalhos. Esses textos refletem o potencial de uma abordagem que combina ciência aberta, formação crítica e tecnologia, sem abrir mão do protagonismo humano na produção do conhecimento. Nesse percurso, o curso foi cuidadosamente estruturado em consonância com diretrizes como a ABNT ISO/IEC TR 24027:2024, que trata da identificação de vieses e da supervisão humana em decisões assistidas por IA (ABNT, 2024a), e com a ABNT NBR ISO/IEC 22989:2023, que oferece as bases conceituais e terminológicas sobre inteligência artificial (ABNT, 2023a).
Ademais, destaco que, ao utilizar ferramentas de inteligência artificial, é essencial que o pesquisador compreenda que os dados inseridos nessas plataformas não são neutros nem isolados: eles passam a compor, de alguma forma, o ecossistema da própria IA. Isso significa que aquilo que se introduz pode, ainda que indiretamente, ser processado, reaproveitado ou mesmo transformado em insumo para o treinamento de modelos futuros. Nesse sentido, a IA deve ser vista como um espaço potencialmente aberto, que pode reconfigurar e redistribuir as informações recebidas. Tal característica impõe ao pesquisador um cuidado ético fundamental, sobretudo quando se trata de dados inéditos, sensíveis ou de propriedade intelectual. O ambiente de IA não é um mero repositório, mas um campo dinâmico de processamento e possível exposição, o que exige uma postura atenta, empática e estrategicamente responsável diante do que se compartilha. Preservar a integridade das informações e refletir sobre os limites do que deve ou não ser alimentado à IA são gestos que atravessam não apenas a técnica, mas também a ética da pesquisa contemporânea.
A proposta formativa também se apoiou nas orientações da ABNT NBR ISO/IEC 23894:2023, especialmente no que diz respeito à gestão de riscos no uso de tecnologias de IA em ambientes educacionais e científicos, reforçando a importância de decisões éticas, conscientes e baseadas em evidência (ABNT, 2023b). Do ponto de vista institucional, a organização dos cursos dialogou com os princípios estabelecidos na ABNT NBR ISO/IEC 38507:2023, que trata da governança da IA nas organizações, evidenciando a necessidade de responsabilidade compartilhada, curadoria de conteúdo e transparência nas práticas pedagógicas (ABNT c). Por fim, o desenho metodológico seguiu parâmetros previstos na ABNT NBR ISO/IEC 42001:2024, norma que orienta a implementação de sistemas de gestão em IA com foco na padronização, controle de qualidade e engajamento participativo (ABNT, 2024b). Ao mobilizar essas normas em diálogo com a prática docente e com as vivências dos participantes, os cursos reafirmaram a importância de uma inteligência artificial que seja técnica, sim — mas também ética, crítica e humanamente significativa.
O Capítulo 5, “Pediculose da Cabeça em Foco: Conexões entre Prevalência, Educação e Intervenções”, de autoria de Suellen Cristina Barbosa Nunes, Ive da Silva Monteiro e Fabiano Cláudio de Oliveira Júnior, propõe uma reflexão sobre saúde escolar e desigualdade. Utilizando dados e modelagem via IA, o artigo discute como práticas educativas podem interferir na incidência de pediculose entre crianças em diferentes contextos socioeconômicos.
Fechando a coletânea, o Capítulo 6, “Inteligência Artificial Como Ferramenta Para a realização de revisões sistemáticas na área da saúde: desafios e perspectivas”, de autoria de Beatriz Scaramelo Ferreira, Yasmin Crelier Gomes Da Silva e Anna Caroline. O artigo analisa o uso da inteligência artificial em revisões sistemáticas na área da saúde, destacando seu potencial para otimizar etapas como triagem e extração de dados. Embora apresente benefícios como economia de tempo, o estudo ressalta a importância da supervisão humana e da ética no uso dessas tecnologias.
Cada capítulo traz em si o espírito da proposta pedagógica vivida nos cursos da Fiocruz: aliar pensamento crítico à inovação. Os textos demonstram que é possível – e necessário – tratar a inteligência artificial não como substituição da inteligência humana, mas como extensão e aliada de suas capacidades analíticas, expressivas e éticas. A coletânea se encerra com o Posfácio, intitulado “Entre Algoritmos e Ações Humanas: IA como Ferramenta Ética e Transformadora”. Nele, propõe-se um olhar ampliado sobre o papel da IA nas humanidades e ciências aplicadas à saúde, reivindicando um uso responsável e orientado ao bem comum.
Nas palavras dos próprios autores, “Ao conjugar teoria e prática, crítica e técnica, os cursos se consolidaram como experiências de vanguarda na formação de pesquisadores aptos a lidar com os dilemas contemporâneos da ciência e da IA”. Espera-se que esta obra inspire outras experiências formativas e acadêmicas, fomentando o debate sobre o papel das tecnologias emergentes na educação e na ciência. e tecnologia. Mais do que um produto editorial, esta coletânea é um convite: a que pesquisadores e instituições se permitam experimentar novas formas de produzir e partilhar conhecimento., sempre atentos ao uso da IA como uma ferramenta, que nas palavras dos autores, “deve atuar como mediadora, jamais como substituta do pensamento.”
- Fabio Coelho Amendoeira
Organizadores: Marcos Rogério Martins Costa; Erika Nazaré Gadelha Meira Cerqueira; Marcos Aurélio Ayres Da Silva; Fausto Klabund Ferraris e Izabela Gimenes Lopes
Autores: Anna Caroline Pereira Castro; Beatriz Scaramelo Ferreira; Caio Eduardo Lessa Gomes; Catarine Aragone de Albuquerque Mello; Daniela Caldeira Sampaio; Elisabete Pereira de Figueiredo; Erika Nazaré Gadelha Meira Cerqueira; Fabiano Cláudio de Oliveira Júnior; Fabio Coelho Amendoeira; Fausto Klabund Ferraris; Ive da Silva Monteiro; Izabela Gimenes Lopes; Lísia Maria Gobbo dos Santos; Ludmila Rosa Bergsten Torralba; Marcella Feitosa da Silva Barboza; Márcia Pereira Gomes; Marcos Rogério Martins Costa; Suellen Cristina Barbosa Nunes; Yasmin Crelier Gomes Da Silva.
Capítulos
Prefácio
Uma Ciência a Serviço da Saúde, da Ética e do Futuro
Fabio Coelho Amendoeira
Capítulo 1
A Escrita Científica com IA Humanizada
Marcos Rogério Martins Costa, Erika Nazaré Gadelha Meira Cerqueira, Fausto Klabund Ferraris, Izabela Gimenes Lopes
Capítulo 2
Uso da Inteligência Artificial na Confecção de Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
Marcella Feitosa da Silva Barboza, Daniela Caldeira Sampaio, Márcia Pereira Gomes
Capítulo 3
Aplicação da Inteligência Artificial para Avaliação da Contaminação por Microplásticos em Alimentos Infantis
Lísia Maria Gobbo dos Santos, Elisabete Pereira de Figueiredo, Ludmila Rosa Bergsten Torralba
Capítulo 4
Prevalência da Infecção por Leishmaniose Visceral em Pacientes com HIV no Estado de Pernambuco
Catarine Aragone de Albuquerque Mello
Capítulo 5
Pediculose da Cabeça em Foco: Conexões entre Prevalência, Educação e Intervenções
Suellen Cristina Barbosa Nunes, Ive da Silva Monteiro, Fabiano Cláudio de Oliveira Júnior
Capítulo 6
Inteligência Artificial Como Ferramenta Para A Realização De Revisões Sistemáticas Na Área Da Saúde: desafios e perspectivas
Beatriz Scaramelo Ferreira, Yasmin Crelier Gomes Da Silva, Anna Caroline Pereira Castro, Caio Eduardo Lessa Gomes
Posfácio
Entre Algoritmos e Ações Humanas: IA como Ferramenta Ética e Transformadora
Sydia Rosana de Araújo Oliveira
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